quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Os pobres vão à praia! A Seletividade emplacada pela Polícia do Rio de janeiro nas praias cariocas!


“Nós gostamos de tudo, nós queremos é mais, Do alto da cidade até a beira do cais,Mais do que um bom bronzeado, Nós queremos estar do seu lado” (Trecho da Música “Nós Vamos invadir a sua praia” do Ultraje a Rigor)


Eram por volta das 14h30m do dia 23 de agosto de 2015 (por coincidência o dia do meu aniversario) quando 15 jovens, a maioria da periferia do Rio, se revezavam em um banco para quatro lugares no corredor externo do Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente (Ciaca), em Laranjeiras, após terem sido recolhidos pela Polícia Militar. O motivo? Estavam indo para as praias da Zona Sul do Rio.
Do grupo que havia sido retirado de um ônibus que chegava a Copacabana, só um rapaz era branco. Os outros 14 tinham o mesmo perfil: negros e pobres. Todos os jovens que apenas estavam em linhas que saem da Zona Norte em direção à orla. Nenhum deles portava drogas ou armas.
Pedindo anonimato, quatro funcionários da Secretaria municipal de Desenvolvimento Social que estavam no local disseram não concordar com o recolhimento dos menores. Uma conselheira tutelar, que também preferiu não se identificar, não conteve a revolta com a situação que, segundo ela, tornou-se corriqueira:
— No início, o critério era estar sem documento e dinheiro para a passagem. Agora, está sem critério nenhum. É pobre? Vem para ca. Só pegam quem está indo para as praias da Zona Sul. Têm menores que, mesmo com os documentos, são recolhidos. Isso é segregação. Só hoje (domingo) foram cerca de 70. Ontem (sábado), foram 90.
A polícia está privando de liberdade esses adolescentes que não cometeram qualquer ato infracional. O que vivemos hoje seria um então choque social que emergem em meio as diferenças de perfil, a seletividade embasada vem de longe e os que se sentem invadidos por suas presenças fazem algo que nem na época da ditadura era imposta.
Na década de 80, a extinta TV manchete produzia um documentário intitulado “Os pobres vão a Praia” que retratava a democratização das praias cariocas, o custo político que ocorreu foi de segregação social entre os praianos que vinha dos subúrbios cariocas e daqueles que se sentiam invadidos por suas presenças.
O então governador na época, Leonel Brizola, criara várias linhas de ônibus na periferia da cidade, fazendo a ligação entre morros e favelas e as praias da zona sul carioca. Esse ato de aproximar as pessoas mais pobres dos principais cartões postais da cidade maravilhosa teve um custo político alto para o então governador. Ninguém até o momento tinha se atrevido a aproximar a elite da pobreza, ato este que não sairia impune.
Um ponto interessante do documentário é quando uma garota da elite diz:
“É gente sem educação mesmo! Não pode tirar o pessoal do Méier, do mangue, e leva-las para Copacabana. Porque eu não posso conviver com pessoas que não tem um mínimo de educação
E continua em outro trecho da sua entrevista:
“cobrava entrada, tem que cobrar entrada. Porque as pessoas que podem pagar entrada, dependendo do lugar, porque Copacabana e Ipanema tem que custar mais caro, as pessoas que moram em Copacabana e Ipanema. É sujeira, colocar uma pessoa bem vestida, legal que tem educação e colocar na praia um monte de gente que não tem educação, que vai dizer grosseria, que vai comer farofa com galinha, vai matar essas pessoas (a elite carioca) de nojo! É um horror”
No exercício da atuação que comete o rio de janeiro hoje, remetendo a obra de ficção “Minority Report”. É inaceitável num Estado democrático de Direito impedir que esses jovens tenham acesso a uma área de lazer da cidade. Um fato escarrado do Estado Policial se encontra em terras cariocas, o que é muito grave. Não podemos fechar os olhos para tais ofensas descaradas aos direitos das pessoas!
Só queremos que a polícia cumpra aquilo que está na lei. Se as crianças e adolescentes estão circulando normalmente pela cidade, não se pode retirá-los das ruas dessa forma. É totalmente ilegal.
Remetemo-nos ao direito de “Ir e Vir”, configurado no inciso XV do art.  daConstituição Federal:
“XV – é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele permanecer ou dele sair com seus bens”
Cumpre expor ainda o artigo 230 do Estatuto da Criança e adolescente, no que diz:
Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem observância das formalidades legais.
Aos olhos da Polícia militar que afirmou, por meio de nota, que “as ações ocorreram visando a proteger menores em situação de risco ou em flagrante de ato infracional”.
Mas que situação de risco? A deles, os menores? A da Elite carioca? Ao ainda melhor: Como a polícia militar prevê o futuro? E de quem proteger?
Selecionar aqueles que estariam em situação de risco, a maioria quase todos pretos, ou quase brancos ou quase pretos de tão pobres são tratados (como já dizia Caetano Veloso), reativando as preocupações frente à postura arbitrária da polícia. O racismo institucional que está cada vez mais nítido.
E o pior de tudo é que ainda tem cidadão "dibem" defendendo a ação da polícia! Esta mesma elite que vai às ruas fantasiadas de “brasileiros”, mas no fundo quando os negros invadem a sua praia, tomam para si o ódio e aflora o discurso de seletividade e das diferenças sociais.
Estamos diante de uma exposição da ação que não seria imaginada nem mesmo pelos maiores roteiristas de filmes de ficção. Uma ação cheia de preconceitos que tem origem no ato de surpreendente simplicidade numa tarde quente, o ato de ir à praia, se tornando praticamente um ato de determinação e perigoso. Se continuarmos assim, iremos voltar talvez ao tempo em que apartheid imperava na África do sul, mas agora em terras brasileiras, ou melhor, em terras cariocas.

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