terça-feira, 10 de novembro de 2009

Chemical Letter

CHEMICAL LETTER

Produzido e Editado pelo Departamento de Estudos e Pesquisas da Interchemical

Ano I – Maio de 1988

Não Parece, mas é.


O homem foi preso no Rio há dias. Parecia marginal, Camisa de português, dessas que hoje se chamam T- Shirt. Paletó surrado. Calças justas, sublinhando as nádegas. Sapato cambado. Cabelos em desalinho. Barba por fazer. Foi preso apesar de seus protestos de que era um padre. Mesmo ao clamor do homem, os policiais o jogaram, sem delicadezas, no camburão. Na delegacia, o delegado, menos insensível, disse: prove que é padre! Telefonado ao Bispo e confirmado: o homem era padre. Era, mas não parecia. Na sua missão paroquial ele procurava assemelhar-se as ovelhas desgarradas do seu rebanho para melhor aproximar-se delas e convertê-las. Só que nem a todos isso era evidente. Muito menos a polícia. Portanto não basta ser é necessário parecer.

O Brasil é caso parecido no julgamento do mundo: é, mas não parece. É rico, parece pobre. Tem futuro, parece não ter. Tem um povo diligente, parece preguiçoso. É sério, parece pilantra. Tem um grande parque industrial, parece uma fabriqueta. Enfim a imagem que dá de si ao mundo não é a melhor. Os próprios brasileiros, numa de bom moço, contribuem para a deturpação da imagem do país, quando fazem questão de acentuar nossas mazelas ao estrangeiro.

Até hoje não entendemos, ainda, porque se insiste em mostrar nossas favelas a quem nos visita!

Ninguém faz isso. Nunca vimos francês querer mostrar os esgotos sujos de Paris, inglês denegrir a Inglaterra, Italiano diminuir a Itália, Americano chacotear os EUA, Nigeriano achincalhar a Nigéria, Butonês ridicularizar o Butão. Nenhum desses países faz de suas fraquezas seu escudo, nem de suas simplicidades seus símbolos. Nós ao contrário, o fazemos. Nossa imagem pretende ser construída lá fora, na base de Pelé – o futebol, que já era: o café – o ouro verde, que já foi: do carnaval – maior espetáculo da Terra, que o mundo todo sabe que não é.

Vamos mudar isso? Está na hora.

Esta carta foi escrita em Maio de 1988. Já passou da hora, mas continuamos na mesma

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