quinta-feira, 26 de junho de 2014

Desvendando mitos sobre o contrato de experiência - Conversas fiadas para não assinar a carteira de trabalho

Certa vez conversei com um jovem trirriense que trabalhava em uma empresa local. O caso daquele rapaz ilustra uma conduta comumente praticada por empregadores de todo país, uma postura que configura flagrante desrespeito a um dos direitos mais básicos dos trabalhadores tupiniquins. O caso era o seguinte: seis meses antes ele havia sido contratado pela empresa, mas o patrão inicialmente se negou a assinar sua carteira de trabalho alegando que os primeiros 90 dias seriam apenas um “período de experiência”. Ao fim deste período inicial, o empregador assinou a carteira, mas após três meses o rapaz foi demitido sem qualquer motivo aparente. Ao procurar o departamento de pessoal, o jovem empregado, agora desempregado, foi surpreendido com a informação de que não teria nenhuma verba rescisória a receber.
Pois bem, a grande mentira contada por esse e por muitos patrões diz respeito ao prazo que a empresa possui para assinatura da carteira do trabalhador. Ao contrário do que eles afirmam, a lei não admite qualquer relação de emprego sem anotação na carteira, ainda que se trate de um “período de experiência”. Na verdade, não existe contrato de experiência sem carteira assinada, isso não passa de conversa fiada. A lei determina que o empregador deve entregar ao empregado sua carteira devidamente anotada em um prazo de 48 horas após a contratação. É o que está escrito no artigo29 da CLT.
Dessa forma, se existe realmente uma relação de emprego, o empregador deve recolher a carteira do novo funcionário e lhe devolver em até 48 horas, com as devidas anotações. Após esse prazo, o patrão poderá ser obrigado a pagar uma indenização de um dia de salário para cada dia de atraso na entrega da carteira, além de estar sujeito a imposição de multa pelo Ministério do Trabalho e a responder criminalmente pelo atraso na forma da Lei 5.553/68, a qual pune com prisão simples de um a três meses quem retiver a carteira de trabalho ou qualquer outro documento de identificação profissional por prazo superior a cinco dias.
Ainda sobre o contrato de experiência, cabe ressaltar que sua duração máxima é de 90 dias, admitindo-se uma única prorrogação, desde que o total trabalhado não ultrapasse os 90 dias. Caso o serviço se prolongue por um período posterior, o contrato deixa de ser “de experiência” e se torna um contrato por prazo indeterminado.
Feitos estes esclarecimentos, voltamos ao caso do jovem trirriense. O que seu patrão fez foi mantê-lo trabalhando sem carteira assinada por três meses e após isso registrou em sua carteira um contrato de experiência relativo aos três meses seguintes. Com isso, buscava eximir-se do pagamento das principais verbas rescisórias ao final do vínculo empregatício. Contudo, resta claro que sua conduta foi notoriamente irregular. Se este caso fosse levado ao judiciário e o trabalhador conseguisse demonstrar que laborou nos seis meses alegados, o juiz ordenaria que fossem feitas as anotações em sua carteira de trabalho relativas a todo período (seis meses). O contrato de experiência celebrado restaria descaracterizado e o trabalhador poderia receber todas as verbas devidas em caso de rescisão imotivada, tais como aviso prévio, fundo de garantia acrescido de multa indenizatória, férias e décimo terceiro proporcionais, dentre outros direitos.
Não estou aqui para condenar nenhum patrão, afinal é do conhecimento de todos que diante da excessiva e absurda carga tributária existente em nosso país, o empresário acaba tendo de se valer de meios indesejados em prol da sobrevivência de seu estabelecimento. Todavia, não se pode admitir que sejam desrespeitados direitos trabalhistas conquistados a duras penas ao longo de séculos de luta operária. Que busquem novos caminhos para seu êxito financeiro, mas, por favor, não à custa do trabalhador.

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