segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Vou interditar o papai


Dia desses fui procurada por uma moça muito aflita. Disse-me ela que o pai, viúvo de longa data e proprietário de um considerável patrimônio, de uma hora para outra “enlouquecera”. O senhor, de idade avançada, havia encontrado uma namorada bem mais jovem. A partir daí, começou a se permitir todo o tipo de “extravagâncias”. Passou a torrar dinheiro com spas, viagens, até cirurgias plásticas e toda sorte de mimos para a namorada. “Meu pai perdeu o juízo”, disse-me a moça. “O que devo fazer para interditá-lo e salvar o que ainda resta da minha herança?”
A resposta, que com certeza não deixou a moça nem um pouco feliz, é: nada. Não há absolutamente nada que se possa fazer num caso como esse. Hoje em dia, a palavra interdição adquiriu um sentido banal, e até nefasto. Não são raros os casos de filhos que a utilizam como uma ameaça, cujo objetivo é tentar controlar o comportamento dos pais e, principalmente, o patrimônio deles. Sob o ponto de vista legal, porém, as coisas são muito diferentes. A interdição é um recurso jurídico para a proteção de indivíduos considerados incapazes, no qual se nomeia um curador que se responsabilize por eles, protegendo os seus bens. Uma das definições que o Código Civil dá aos incapazes é a de pessoas que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para exercer os atos da vida civil. Ou então, são incapazes, em relação a certos atos, os alcoólatras habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido. Nesses casos específicos, para que a interdição ocorra, o juiz, assistido por especialistas, examinará pessoalmente a pessoa cuja capacidade está sendo questionada, além de analisar sólidas e inequívocas evidências médicas.
Obviamente, esse não é o caso de um viúvo idoso que decide dar presentes caros a namorada mais jovem. Se ele não é doente mental, nem alcoólatra, nem viciado em drogas, não havendo, portanto, nenhum motivo válido para a interdição, não há nada que o impeça de gastar seu patrimônio como bem quiser. A única coisa que ele não pode fazer é doar a metade de seus bens que, por lei, comporão a herança dos filhos. Porém, gastar todo o seu dinheiro como bem lhe aprouver é um direito que lhe cabe. Aos filhos que se encontram nessa situação, a saída mais digna é tratar de construírem, eles próprios, o seu patrimônio, e deixar que os pais usufruam em paz o que lhes pertence por direito.

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