segunda-feira, 22 de março de 2010

Crônica do dia - 22-03-2010

PEREGRINAÇÃO DE UM RECLAMANTE


Boa noite, senhoras e senhores!
No ar, mais uma apresentação do seu programa favorito Um brasileiro na Justiça do Trabalho!
Basta você mandar seu nome e endereço, junto com uma embalagem de qualquer produto globalizado (o produto fabricado por 9 entre 10 reclamantes), para ser um brasileiro especial, ganhando, inteiramente grátis, o patrocínio através dos advogados do Escritório Doria & Doria, de uma reclamação trabalhista.
Agora , com a presença do Sr. Fiscal do Ministério do Trabalho e do Procurador Regional do Trabalho, vamos sortear uma carta, que sem dúvida será a sua, para vermos quem será o felizardo a ter seus direitos trabalhistas defendidos por um dos maiores advogados deste país!
Vejamos: o ganhador é... o Sr. João Maria da Silva! Bravo, Sr. João, morador de Fica-Quem-Quer, no Estado do Rio de Janeiro. A produção irá ter à sua casa e o trará para uma consulta com os advogados de Doria & Doria.

Passados alguns meses...

"Bem, vejamos: o Sr. acaba de postular na Junta de Conciliação e Julgamento, doravante denominada JCJ., que deverá marcar uma audiência preliminar dentro de 10 meses. Isto mesmo, sr. João, o senhor está com sorte, pois com a influência do programa pudemos antecipar a audiência. Bravo!"

"Sr. João, infelizmente não foi possível realizar a audiência, pois o Reclamado, o patrão, não compareceu, estava doente e mandou um atestado médico. Mas isto não é nada, provavelmente em oito meses teremos sua audiência e vamos resolver tudo."

"Desta vez não foi possível conciliarmos, mas o Juiz marcou outra audiência - a segunda, de instrução e julgamento e aí sim, vamos arrebentar. O sr. traga três testemunhas... Mas o que é isto Sr. João, não desanime, só vamos esperar mais seis meses..."

"Olha, a nossa prova foi boa, embora só tivéssemos uma testemunha ouvida, porque o Juiz indeferiu as outras duas. Mas não se amofine, isto é bom para nós, é sinal que ele está convencido de seus direitos. A sentença deve sair dentro de uns três meses. Sabe como é, acúmulo de serviço, todo mundo reclamando depois que a Constituição de 88 deu tantos direitos ao empregado."

"Sr. João, tenho boas novas para o senhor. Ganhamos, ou melhor, foi parcialmente procedente, enfim também não podemos esperar ganhar tudo, né! Agora vamos executar a sentença."

"Não é que o patrão entrou com embargos de declaração? Mas fique tranqüilo que o Juiz não vai modificar a decisão. Isto faz parte do jogo, não fique desalentado, afinal será somente mais uns dois meses."

"Enfim, posso lhe dar uma boa notícia. O Juiz não acatou os embargos declaratórios, tá me entendendo. Não? Pois é, mantivemos a sentença, embora o patrão tenha entrado com um RO. Não sabe o que é um RO? È o recurso ordinário. Nós vamos aproveitar e entrar com um recurso adesivo - cerceio de defesa. Não se preocupe, embora vá demorar um pouco no Tribunal, uns dois a três anos, a sua ação está ganhando um status maior, vai para o TRT e será apreciada definitivamente por Juizes Superiores. O seu processo está se avolumando, sr. João. Isto é ótimo."

"Como vai, sr. João, depois de um bom tempo que a gente não se via, temos uma boa notícia. Ganhamos no Tribunal. Mas o patrão está tentando procrastinar, ou seja, enrolar um pouco, mas não se impressione por ele ter entrado com uns embargos declaratórios do acórdão. Como já disse antes, isto é comum. Não se preocupe, somente mais uns três meses e pimba! Vamos executar o seu processo. O senhor está com tudo, o seu processo causou boa impressão nos cinco Juizes que o julgaram."

"Olha, foi bom o senhor ter vindo ao escritório. Não é que o patrão agora entrou com um outro recurso! Recurso de Revista, matéria constitucional. O seu processo está crescendo, seu João. Isto é bom. Vai ser examinado pela mais alta corte trabalhista do país. E veja bem, pelos melhores juizes! Agora não tem erro."

"Ah! Tenho uma boa notícia. O recurso de revista do patrão foi indeferido a subida. Grande coisa, pois ia demorar uns dois anos mais. Agora que eles agravaram de instrumento será mais rápido. O senhor é um homem respeitável, pode dizer aos seus colegas de trabalho que seu processo vai a Brasília! Isto não é para qualquer um!"

"O senhor recebeu meu telegrama? Pois é, o agravo de instrumento não foi provido, mas eles entraram com embargo regimental para o Pleno. Que honra hem? Ter uma reclamação julgada pelo Pleno do TST! Eu sei... Mas é somente questão de meses. Estamos perto! Estamos perto!!"

"Tá sumido, seu João. Tenho ótimas notícias para o senhor. Ganhamos. Agora vai ser tudo mais rápido. O TST mandou baixar a ação para a Junta para ser ouvida aquelas duas testemunhas, se lembra? Aquelas duas testemunhas que o Juiz não quis ouvir. Vamos ter uma nova audiência e ter uma nova sentença. Agora vamos à forra. Vamos mostrar para este patrão quem manda no pedaço. Foi bom assim. Imagina se eles entrassem com uma ação rescisória, cumulada com medida cautelar com pedido de liminar para suspender a execução. Ainda bem que isto não aconteceu. O senhor tá com uma sorte. O mundo sorri para o senhor. Bravo, grande homem!"

Passado alguns anos, onde foi proferida nova sentença, novos embargos, novos recursos, novos agravos de instrumento, novo recurso de revista, recurso extraordinário no Supremo e ação rescisória com liminares e tudo mais...

Diálogo do absurdo (por Camus ou Kafka)

Advogado atende a uma chamada da supernet, na tela de seu relógio celular:

"Bom dia, em que posso..."
"É sobre um processo de João José da Silva."
"Deixe-me ver. João, João... Ué, o senhor não é seu João!"
"Não, sou o neto dele. Mas o senhor também não é o Dr. Doria!"
"É. Também sou neto. A tradição de pai para filho continua, agora somos Doria & Doria & Doria. Mas me diga por favor: o que seu avô estava reclamando?"
"Era uma bobagem de anotação em carteira de trabalho, coisa do século passado. Nem sabia que existia isto. Este pessoal de 40 anos atrás tinha umas manias..."
"Bem, vejamos... pelo arquivo do supermail nos diz que vamos iniciar a execução. O senhor está com sorte, hein! Foi bom ter me contatado, precisamos habilitar os herdeiros no processo..."

(autor: César Doria, advogado em Niterói.



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