terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Crônica do dia - 29-12-2009

Hoje publicarei duas crônicas sobre o natal.

A primeira é sobre a passagem do meu natal de 2009.

A segunda é uma crônica do Padre Fábio de Melo, publicada no Jornal "O Dia" do Rio de janeiro em 26-12-2009, sobre o seu natal na infância, que é semelhante aos da minha e de muitas outras pessoas quando pequenas em suas casas.

Meu Natal de 2009

Natal 2009. Mais uma vez, este ano passamos o natal em família. Passamos na cidade de Água Doce do Norte, cidade onde mora meu pai. Este ano estivemos reunidos em um número menor de parentes.


Como em todos os anos até este, eu e minha esposa e nossos dois filhos estivemos juntos mais uma vez em nossa linda ceia de natal.


Além de minha família que se deslocou para essa cidade onde mora meu pai, também viajou até este destino uma querida irmã que mora na capital.


Como estávamos na casa de meu pai, lá estavam ele e sua esposa e seus dois filhos deste segundo casamento.


Depois de alguns anos de ausência de um de seus filhos, este estava presente neste ano.


Esteve presente também seu filho que mora nesta cidade, bem como sua esposa e seus dois filhos.


Éramos um número pequeno de parentes, mas com uma presença espiritual muito grande. Para completar nosso natal estiveram presentes mais de uma dezena de amigos que moram na cidade que aceitaram o nosso convite para a ceia de natal.


Ao final nos tornamos uma única família e a confraternização foi excelente e harmoniosa.


Por fim, o dia seguinte como em outros natais não ficou sem festa, só que desta vez a farra foi realizada na casa do futuro sogro de minha única irmã solteira.


Até o próximo.


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Padre Fábio de Melo: Natais e mudas de alface

A manhã chuvosa parecia costurada nos embaraços de uma noite mal dormida. O vulto de mulher prateado pelos raios de um sol recém nascido recolhia do tempo às agruras de saber-se temporário, imperfeito, afeito aos desajustes de um amor que adormeceu, mas que não desaprendera de amanhecer.

Era um corpo de dor, de menstruadas esperanças, de saudades e partos. Corpo de mãe, corpo de cumprir ofício de curar joelhos esfolados, de dar banhos que tinham o poder de lavar corpos e almas num mesmo acontecimento.

Corpo de amamentar filhos que crescem.

Aquela mulher e aquelas manhãs de dezembro. As recordações de seu tempo de menina, pobreza reconhecida, trazida na cara e denunciada pela moldura de olhos que não sabiam mentir.

O plantio programado, compromisso que nem mesmo a dor acontecida nas recentes horas poderia adiar, tinha ares de ritual religioso. A sementeira ao lado, moldada numa caixa de papelão resistente, sobre o canteiro que nasceu de suas mãos pequenas, esperava pela oportunidade de cumprir no tempo o destino de dar continuidade à obra da criação.

Morrer e viver são atos que se conjugam sem pressa.

A mulher sabia de tudo isso. As mudas miúdas também. Dotadas de sabedoria vegetal, cresciam ao seu tempo com a mesma simplicidade que é própria de quem não procura outro destino senão o seu.
Aquela mulher sabia mais. As mudas não mudam.

São sempre as mesmas desde o tempo de sua mãe. Ofício aprendido que se estende no tempo, feito consumação de uma despedida que se cumpre aos poucos, bem aos poucos.

Mudas de alface estão carregadas de sentido. Nelas, prepara-se o futuro que afugenta a fome, traz variações ao modo de carecer.

Recordo-me com saudade. O tempo era de chuvas. Jabuticabeiras explodiam.

Pequenos frutos pendurados em seu corpo de árvore-mãe, tal qual a minha mãe e seus meninos pendurados na cintura, entrelaçados nas pernas e puxando seus braços.

Dezembro tinha cores e histórias diferentes. Vitrines iluminadas, cartões de ocasião sendo preparados pela minha irmã, para que mesmo com simplicidade pudéssemos desejar votos de felicidades.

Presépio sendo retirado da caixa, árvores coloridas de bolas vermelhas, anunciando que nossa pobreza seria ainda mais exposta. Mas não havia problema. Nossa árvore, mesmo tão pobre, já era nossa alegria. As jabuticabeiras nos curavam de tudo...

Minha mãe e sua capacidade de replantar o mundo a partir de mudas de alface era o símbolo mais vivo de nosso Natal. Com seu jeito simples e hábitos rotineiros, ela condensava todas as virtudes que o acontecimento nos sugeria.

“O menino Jesus é quem merece presente neste dia!”, ensinava-nos como se quisesse modificar a ordem do mundo.

E assim acreditávamos.

Nossos presentes eram poucos. Quase nenhum. Só mesmo para não passar em branco, mas o mais importante nós não deixávamos de receber. O sorriso farto, a oração em família, a missa do galo e o nosso Natal já estava completo.

Aquela mulher nos fazia esquecer o que não tínhamos. Transplantava-nos, como fazia com as mudas de alface.
Deixávamos o chão estreito da sementeira e caíamos com nossas raízes nos canteiros fartos da simplicidade que ela sabia construir.

E assim era o nosso Natal.

Um acontecimento para nunca mais esquecer.



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