segunda-feira, 30 de maio de 2016

Não se trata apenas de machismo: O estupro coletivo no Rio de Janeiro é fruto também do descaso do Estado com as periferias

No se trata apenas de machismo
Trinta e três homens estupram uma adolescente de dezesseis anos. Prontamente vem a indignação e, com ela, a discussão acerca do machismo. Os impropérios publicados por vários rapazolas no Facebook reforçam o estereótipo e a preocupação, que desencadeiam uma nova horda de publicações e comentários na rede. Aos poucos, contudo, o debate vai se esterilizando, a quantidade de publicações caindo e a web voltando à normalidade.
Cabe observar, entretanto, que além de suscitar o debate sobre o machismo e a cultura do estupro, a conduta dos delinquentes traz uma outra reflexão: de trinta e três agentes, é muito provável que ao menos um deles tenha discordado de praticar o abuso, mas, por medo dos demais, tenha participado. Parece tratar-se da teoria da espiral do silêncio, de Elizabeth Noelle-Neumann, segundo a qual o indivíduo que se vê em minoria prefere omitir-se a apresentar sua discordância. A ignorância tende a potencializar esse processo.
Nesse sentido, o estado de anomia nas periferias levanta outro debate: se o Estado chegasse às comunidades e cumprisse seu papel educacional, isso teria acontecido? Teria havido a suscitação da ideia ou a aderência dos demais a ela? A resposta provável é não.
O grande problema, ao que parece, é que o nosso direito, apesar de diversos avanços (como por exemplo nas áreas do direito do trabalho e da família), permanece uma instituição de perpetuação de status quo, um instrumento de dominação, conforme expusera Marx, de uma classe sobre outra (se não expressamente, como resultado de sua execução).
Ora, mantendo o estado das coisas, permanecemos à mercê da anomia nas periferias, marginalização, ignorância, cultura do estupro, do machismo etc.
Isso não é resultado apenas do machismo, mas também do direito, da lei e da nossa cultura jurídica. Evidência disso é a intenção da advogada da vítima de afastar o delegado que cuida do caso da adolescente carioca, que na delegacia teria perguntado à garota se ela costuma fazer sexo em grupo, conforme noticiado pelo G1. Para as pessoas em geral, isso pode causar estranheza; para quem atua no judiciário, mais verossímil, impossível.
Vencer os problemas do machismo, que está dentro de todos nós, homens e mulheres, em maior ou menor medida, é só um primeiro passo, de uma longa caminhada. Na ladeira. Bem íngreme. Numa perna só.

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