terça-feira, 6 de julho de 2010

06-07-2010 - Crônica do dia

Rainho do lar
Publicação original em 21.janeiro.2000

Já estou começando a desconfiar que o século 21 só começa em janeiro do ano que vem. Não, não se trata de arrependimento nem me rendi à numerologia historiográfica. É que me disseram que o século 21 seria o século das mulheres, mas até agora não vi mulher nenhuma com cara de dona do século. E, entre ter que aturar mais um século masculino e acreditar que o novo século ainda não começou, fico com a segunda opção.

Comecei o ano na maior animação, me sentindo mais leve, livre do peso de ter que sair de casa pra trabalhar vestindo terno e gravata, encarar o expediente, almoçar na base do vale-refeição, ficar contando os minutos para o final das oito horas, passar na padaria para comprar carioquinhas e ter que relatar o dia inteiro pra mulher ao chegar em casa...

Já tinha desistido de tudo e estava em frente ao espelho, ajeitando o cabelo, colocando os bobs, passando o protetor labial, colocando perfume nos pulsos, no peito, atrás da orelha, cortando e serrando as unhas, esfregando cremes pra pele, tomando banho de ervas e sais minerais...

Estou aqui como a namoradinha que senta na sala de estar, com todo cuidado pra não amassar a saia, e que fica olhando para o relógio, conversando com os pais, enquanto eles dão conselhos sobre onde ir e a que horas voltar... Estou esperando meu par perfeito, a mulher, dona do século 21, e ela não chega.

Quero que ela diga que estou bonito, que me abra a porta do carro, que passe a mão na minha perna antes e depois de passar a marcha, que me leve ao cinema e pague minha entrada, que me convide para jantar em um restaurante chique, que sugira levemente que quer me levar a um motel — eu só aceitarei depois do terceiro encontro —, que me faça um filho, que se case comigo mesmo sem ter terminado a faculdade, que faça questão que eu não trabalhe para ficar cuidando dos filhos...

Quero esquentar comida num forno de micro-ondas, lavar roupas numa Brastemp, guardar comida congelada, inspecionar a empregada, a cozinheira, a lavadeira, a faxineira, o zelador, o bombeiro, sair com uns amigos pra passear no shopping e usar a valer o cartão de crédito de minha mulher, esperá-la para jantar, perguntar-lhe como foi seu dia...

Quero assistir ao Amauri Junior, à Ana Maria Braga, ao Vale a pena ver de novo, e quero entender, assistindo à Silvia Poppovic, por que minha mulher ficou tão fria depois do casamento, por que diminuiu o número de nossas relações sexuais, por que ela chega cada dia mais tarde em casa, por que ela vai me trocar por dois rapazes de vinte anos...

Enfim, onde está essa mulher, dona do século 21? Eu não agüento mais ser o chefe da família, quero trocar a pasta de couro pelas luvas de plástico, o revólver pelo mata-moscas, o pager pela pinça, o sapato bico fino pela chinela de pano. Dou o século 20 por encerrado, que venham as mulheres, quero ser o rainho do lar!

Eduardo Loureiro Jr.
(O Pátio)

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